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Crónicas de Uma Viagem 2

(continuação) by Maria Liberdade

            Saio da garagem do prédio que habito, junto ao rio, com o termómetro exterior do carro a marcar 15º C. Deparo-me com um nevoeiro cerrado e vejo o termómetro a baixar vertiginosamente, tanto que, ao fim de 6 quilómetros decorridos vejo registados 5º C. O nevoeiro não levanta e na auto-estrada o termómetro cai até 1º C! Prevejo que a minha viagem até Santa Maria de Além-Mar vá ser debaixo deste nevoeiro e com muito frio; mal sabia eu que estava redondamente enganada...

            Tenho o hábito de não colocar a antena do rádio no carro para que não ma roubem, nem mesmo em viagens grandes, pois tenho receio de me esquecer de a tirar depois, ou seja, ao fim de uns 60 quilómetros percorridos, começo a ficar sem conseguir ouvir rádio e, como não tenho leitor de cd's, digo para comigo “hora de falar com a minha amiga João, do Porto”. Coloco o auricular e faço a ligação. Quase sempre sou bem sucedida e damos dois dedos de conversa, ela no Porto e eu em viagem. Falamos do tempo e respectivas temperaturas, do que fizemos no dia anterior, dos planos para o fim de semana, do que nos preocupa, enfim, conversa de duas grandes amigas. A João faz-me companhia durante alguns quilómetros, mas tem de desligar, pois está a trabalhar e não pode estar à conversa comigo a viagem toda. Desligamos e caio nos meus pensamentos. Há muitos anos conheci um rapaz que nem sequer tinha rádio no carro e eu fiquei escandalizada, como era possível?! Mas ele retorquiu “é muito bom, tem vantagens, pois fico entregue aos meus pensamentos, nada me distrai e, por vezes, tomo importantes decisões durante o trajecto entre casa e o trabalho, pois tenho tempo para pensar na vida!”. Hoje ao deixar de conseguir sintonizar qualquer estação de rádio durante as minha viagens, recordo as palavras do Gil e dou-lhe toda a razão; é mesmo bom!

            E o nevoeiro não se dissipa, dando a ilusão de que tudo à minha volta deixou de existir... Exige-me que vá a uma velocidade menor do que a habitual, mas em contrapartida não tenho de estar constantemente a olhar pelo retrovisor para controlar os carros quer me sobrevêm, se se aproximam demasiadamente do meu, se me apanham em excesso de velocidade...


            Subitamente o nevoeiro desaparece, o horizonte começa a ficar raiado em tons de laranja, rosa, anil, vários tons de azul, um pôr do sol soberbo! Agradeço a faculdade de poder ver! Ah como eu gostava de saber pintar, de conseguir eternizar numa tela a beleza que vejo. Não fui dotada para a arte da pintura, mas tive um professor na faculdade, o Silva Leite, que dizia que para a artes manuais, fossem elas quais fossem, “todos têm jeito, só que alguns precisam de mais tempo do que outros”. Não sei se tinha razão; provavelmente sim.


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