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Mensagens

A mostrar mensagens de julho, 2018

pintando em tom amarelo e com a força das árvores

Ora repara! Anda gente lá atrás azafamada, não sorrindo, aguentando as pesadas gotas de chuva de todos os dias.  Mas…repara bem! E há lá um que escapa ao pesado das gotas e está dizendo: – Quantas vezes já repeti para deixares andar…? Não penses em demasia, deixa fluir!  - És louco e passas a vida a sorrir! E olha que é no sorriso dos loucos que mora o perigo! – responde um dos que todos os dias sente o peso da chuva. -No sorriso dos loucos mora o Sol e os seus raios são quentes e densos o suficiente para transferir calor do centro para fora. É o que vai acontecer de imediato! E a gente lá atrás azafamada vê surgir um manto amarelo, raios em expansão! A gente atónita ergue os pescoços para perceber o que está a acontecer.  Não consegue, dada a intensidade do clarão, enxergar mais nada que não seja o amarelo que se estende à sua frente. Perde a realidade o seu sentido e vivem apenas e agora desta força única do Sol. Tudo se abre a esta nova onda: as ruas, os passeios, as ca

Tretas!

Acreditaste que, com o tempo, ganharias em elegância e subtileza. Tretas!!  Acreditavas que, com a idade, pensarias duas ou três vezes e nunca à primeira, de rajada, como quando ganhavas em beleza. Tretas!! Quando jovem, acreditaste que, impregnando impulso nas primeiras impressões, tudo se compunha de forma natural e sem hesitações. Tretas! Hoje, estás quase a acreditar que as primeiras impressões são falíveis preconceituosas, ingénuas, selvagens, nada credíveis. E, no entanto, nem sempre pensas duas vezes…Só tretas! Acreditaste que estavas no topo do mundo cheia de pujança, eras o centro das atenções. Tretas! Hoje, acreditas que já podes fingir que vales alguma coisa acreditas no carácter teatral que nos rege a todos e que nos confere, à medida que envelhecemos, um estatuto especial. O espetáculo vai sendo montado (Ah! pois é…) e há até quem pague bilhete para assistir sentado E tu, agora, daí desse palco, com a capacidade doce para assistir a todas as tretas sorrind

Ásia das Monções

Tema da aula de Geografia. Calharia a um de nós apresenta-lo individualmente. “Dar a aula”! Na década de 90 do século XX era uma novidade pedagógica no Liceu de Castelo Branco…e um pavor para nós, pupilos. Ainda mais com a temível, terrível professora de Geografia. Excelente professora mas que nos mantinha em sentido. No corredor reinava o pânico. Serás tu? Tu? Ou tu? Contrária à sua natureza insegura, tímida, stressada, aqui a vossa amiga estava estranhamente calma. Não era normal! Tranquilizava a malta, apoiava os mais nervosos, confortava os necessitados, … qual irmã de uma congregação perto de si. Ao toque aparece a mentora, o silêncio aterrador instala-se e entramos como gado prestes a ser degolado. Sentamo-nos. O olhar arguto pousa em todos nós e, invariavelmente, dá-se o fenómeno da avestruz, baixar o olhar e a cabeça como se invisíveis fôssemos. A boca abre-se e, sem hesitação, “Helena Goulão, venha ao estrado, se faz favor.” Nesse momento, e no meio de um s

Professores

Tecla gasta? Tecla gasta. …mas vou teclar na mesma. Rebelde e anti-prof assumida recordo …o de Biologia que me fez optar por Línguas; …o de Português que despertou em mim o gosto pela escrita; … a de Inglês que sempre me atribuiu notas justamente elevadas; … o de Jornalismo que acendeu a chama da criatividade em pleno século XX; … a de Antropologia Cultural que me obrigou a fazer o meu primeiro “trabalho de investigação” – Medicina Tradicional (manuscrito que não havia cá nada destas modernidades!...a capa até ficou engraçada); … o de Filosofia que não me deixou alternativa senão pagar a primeira e única explicação da minha vida: Filosofia de 12º ano! Recordo, com muito carinho, aquela que, sem dúvida alguma, marcou o volante do meu percurso: a minha professora de História. Os recortes de jornais sobre Arqueologia que me fornecia à socapa, a forma como leccionava, a forma de estar,…e pumba. Findo o 12º ano o que fazes? ARQUEOLOGIA! Aprendi imenso. Com o de Ro

Ciclogénese explosiva

Francisca atravessou o jardim e escutava encantada, mas atónita: que ventos estes? Procurava incessantemente um objeto perdido. Havia um raio de sol que desenhava sombras no chão e tudo parecia perdido e espalhado naquela relva macia. Nisto, e de repente, olha para um determinado ponto de um canteiro e vê uma pequenina luz brilhando. Batia palmas. E um vento mais forte surgia. Recordações destas não eram de perder. Era uma medalhita, nada de prata, nada de ouro, latão apenas, mas rica e preciosa como tudo. Era a recordação da sua avó que tinha sido mãe, irmã, amiga, professora e mais tudo isso e tudo aquilo. Faz hoje três meses que morreu. E parece que está ali no jardim a olhar para ela e a repreendê-la: «Franciiiiisca!». Estes têm sido os piores meses da sua vida. E tudo por causa de quatro paredes ao alto avaliadas em alguns milhares. Estas quatro paredes ao alto com este jardim descuidado e soprado por estes ventos fortes. Esta avó tinha sete netos com diferença de três anos ent

Adeus!

Se fossemos seres atentos, até poderíamos ouvir o suspiro, o suspirar dos segredos inconfessáveis, a voz dos viciados em sonhos e coisas temperamentais, ou seja, coisas perigosas que nos descompõem, às vezes. E era, assim, que todos os dias, fizesse chuva ou fizesse sol, ali estava de olho nas gentes que passavam pelos passeios carregados de pó e punha-se quente a magicar. E de tanto magicar, cansava-se ao fim de cada dia e parava, por vezes, e por momentos, num descanso ilusório de espinha curvada. Ele esteve sempre ali e sabia muito bem quem ela era, pois já a vira umas quantas vezes e outras tantas já a sentira muito de perto. Todas as quartas feiras, ela passava por ali, bem perto, descia e subia a calçada sem levantar os olhos dos pés, caminho calado e absorto, próprio de quem anda ensimesmada. Também sabia muito bem quem ele era. Sempre soube! Eles eram aqueles que, por vezes, apareciam de soslaio e se olhavam como se dissessem «Invado a tua alma e faço por possuí-la de ideias

Aos tombos

Nos meus sonhos há quase sempre pesadelos. E tudo se passa quase sempre a voar. Todos voam, inclusivamente, eu. Há sempre um trânsito engarrafado em céu amarelado. E há monstros que aparecem para me olhar. (Como se olhar fosse algo que me assustasse…). Um ligeiro encosto e dou cada tombo! Levanto-me, arranco em corrida e elevo-me no ar. A luz avassaladora do sonho a cobrir-lhes o corpo e logo tudo se transforma em pesadelo (para eles, claro!). Dão cada tombo e não se conseguem levantar! Mónica Costa ( a pintura que acompanha o texto é obra de Anna Bocek)

Lugar da Amizade

Este blog é um lugar arquitetado para o desabafo e para o desanuviar. Era, inicialmente, sala vazia.  De rompante, a Helena escancarou a porta desta sala e fez entrar as Marias (para quem não sabe, são seis mulheres espetaculares e profundas, todas diferentes, uma equipa fabulosa, núcleo duro). Por si só, elas encheram a sala.  Depois, em jeito tempestivo, a Helena agarrou na sua mochila e iniciou viagem, sempre em linha reta em forma de folhetins de Andrómeda e Kindergarten, buscou uma companheira de caminhada que veio espreitar em jeito de crónicas de viagens. Mais pessoas foram entrando e deambulavam e cruzavam cenários e experiências, umas já sentadas confortavelmente no sofá, outras espreitando e fugindo. Umas quantas foram ficando. Surge um convite. A matrona faz-me um convite: «E se tu também contribuísses para a decoração desta sala com os teus desabafos em vez de, simplesmente, estares aí sentada nesse sofá?». Eu?!! Não sei escrever textos bons! E a Helena reage: « Não

Janela aberta

Esta casa é janela aberta. Aberta para o ar que entra fresco e para o sol que surge forte. Esta casa é a minha não pelas coisas que tem mas pelas coisas que respiram dentro dela Não é casa rica, mas é uma rica casa! Vive cá dentro a jarra de flores que aperalto delicadamente no móvel vivem os quadros e as fotos que têm histórias para contar respira o sofá que nos acolhe em alegria e em cansaço estica-se a cadeira espreguiçadeira no alpendre que dá acesso ao teto do mundo. Vivem os cheiros a bolo acabado de fazer e da gelatina que está no frigorífico Vivem as vozes e os abraços e os sussurros e os pensamentos Esta casa é porta aberta. Aberta para atirar tralha fora, deixando espaço e energia a fluir Aberta para dar tempo ao tempo que faz lá fora e entra pela janela adentro Esta casa é porta aberta. Aberta àquele que entra a bem e traz consigo o ar fresco e o sol forte É porta aberta para caminhos É espaço que se expande no mar e no vento, nas árvores e na chuva, casa

Pessimista

Sorriso largo.  Esperança no futuro. Boa onda. Alguém acredita. Está alegremente convicta. Um estado construído (mesmo pensando que não) à custa de alguns suores e lágrimas. Caminho que se vai construindo caminhando, angústia em cada tentativa, orgulho em cada pequena conquista. Processo lento e paciente que enche cada dia de novo fôlego, alimentando a sensação de que, ainda que sob a forma de migalha, se contribui para a melhoria do mundo. E assim se vai sendo feliz. E depois há sempre o outro. O que ali está sempre tão sério, à cabeceira da mesa, queixo apoiado em mãos moles, olhar mortiço, de suor no rosto, apenas por causa do calor que faz nesta sala. E pensa «Tomara eu ter a tua energia!», mas, ao invés do reforço positivo e humildade necessária capaz de dizer «Ainda bem que existem pessoas como tu para que outros, como eu, possam estar parados e sossegados neste olhar mortiço.», dispara com todas as balas de que dispõe: «És uma optimista!» como quem diz «És uma ingénua!». E

Ela vive da ferida aberta que infeta

Ela é a vontade do destino. Uma vida à face da Terra na mais tremenda inutilidade. Se fosse única, não havia problema, mas ela pertence a um grupo dos mais horripilantes e numerosos grupos à face da Terra. Portanto, não há nada a fazer! Não é ela, são elas! São minúsculas, mas propagam-se de forma exímia. São às quinhentas a oitocentas de cada vez. É praga! Não há nada a fazer, só esperar que se cumpra o desígnio.  Elas aí vêm!! São a destruição das nossas arquiteturas mais belas, causam-nos embaraço por se adaptarem de forma exemplar e subtil ao normal funcionamento desta Máquina. Ganham vida própria ao sabor das suas pretensões. Não têm qualquer utilidade, apenas aparecem, são geradas e sobrevivem à custa dos outros.  Esta, que me mira atentamente, é uma arrastadora de moléstias e, por cada maldade, suga-nos o sangue em três tempos e transforma-o em glória. E é,  nesse momento, que muito azul, muito cheia de papo, abominável, sem saída, presa dentro de si e orgulhosa, enclausu

Autoridade

Quando era criança, sentia-me pequena em tudo subalternizada, insegura e alinhada, sem direito a protesto Nós víamos os nossos pais de baixo para cima eram o suporte, a segurança, a responsabilidade, a maturidade Eles lá estavam impávidos e implacáveis nós levantávamos a cabeça, atirávamos o nariz para o teto e eles lá estavam naquele alto, de dedo em riste quase a tocar o céu. Por que será, então, que eu, hoje, detendo, agora mesmo, o papel de madura e responsável de tamanho suficiente para poder chegar ao céu me sinto, na maioria das vezes, ao lado dos meus filhos e nunca acima deles?! Mónica Costa (pintura de Enric Torres-Prat)

Terás os teus 15 minutos de fama

Muitas vezes me interrogo o que leva as gentes a ansiar por protagonismo imediato, efémero, nímio. Várias possibilidades me ocorrem… A inépcia com que nascem e que as leva a trepara por aí, ali, acolá num frenesim tonto e sorriso lerdo como se não houvesse amanhã. Estrebucham semiescamente e lambuzam bovinamente outrem que lhes aparente consignar benefícios. A ausência de beleza estereotipada das sociedades actuais qua as fazem refugiar-se numa ânsia vingadora de que o poder é belo. Para isso se envolvem numa cápsula de pseudo-grandeza de nariz empinado e apinocado, com gola de camisa engomada mas amarelada. O verdadeiro prazer em dominar, pisar o palco da fama por, sem ela, não serem “alguém”. A fama acarreta exposição pública, dinheiro, posição social, amigos,…Um alguém fátuo, momentaneamente satisfatório, muito satisfatório! Poucos serão as gentes que têm o protagonismo de mérito. Aquele que perdurará, será recordado e honrado. Na sociedade actual é mais fácil, mais si

Ele e Ela

E ela chega, como quem não quer nada, e dispara: - Ter poder para desejar com tanta força que se concretiza é o meu maior medo. E ele, assustadíssimo… (fotografia de Robert Frank)

Não

E há precisos momentos em que um Não se impõe! Mas o problema é que um Não é quase sempre uma afronta nunca um reconhecimento ou uma evidência. (obra de Soizick Moiester)

E foi neste estado paranóico que me deixei levar pelo rodopio

Aqui há uns anos, quando o meu gosto era mais refinado, encarava as festas de verão como algo fantástico. As luzes em pisca-pisca eram milhares de sóis dentro e fora de mim, os carrosséis atiravam-me ao ar com dignidade e as músicas psicadélicas, mais as roulottes de farturas gordurosas e açucaradas faziam as nossas delícias enquanto canalhada acneica. Tudo era sinónimo de completo êxtase. Marchava-se em passo solene para o local da romaria e desfilava-se de nariz no ar, inalando o mágico odor a pipocas. Havia sempre uma saída consentida até às tantas da manhã na companhia de vizinhos e amigos. Não havia um único detalhe que estragasse a alegria. Ia-se simplesmente para a festa porque era tradição, porque sim, de cabeça leve. Não havia a regra do pai nem a imposição da mãe, havia uma ausência completa de limites que instauravam a sensação de sermos livres sem o sermos. Havia festa e havia verão e isso chegava. Até parece mentira dito desta forma, mas a fotografia não mente e aquele qu