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A mostrar mensagens de outubro, 2018

E aquilo que resta é sempre o início de algo feliz!

Hoje! Aula dedicada a provérbios e quadras populares. A sabedoria popular! Miúdos de doze anos a pensar provérbios!! Que aparente disparate! Um dos provérbios vinha a propósito do tempo! E começa uma série de queixas: - Faz chuva, dia cinzento… - Foi-se o verão! - Oh! Que pena! – exclamam todos! - Lá se foi a piscina! - Aulas!! Que seca…! E diz alguém, de dedo em riste:  - «Depois da tempestade, vem a bonança!» E lá se desfiou uma conversa da qual se extraiu uma verdadeira lição – simples e eficaz. - Não nos podemos queixar! Temos de aproveitar o que temos! (Às vezes, é tão reconfortante ouvir a inconsciente ingenuidade otimista das crianças!) Diz a Bruna: - Olhe, professora, está um dia cinzento, um dia de chuva…posso dedicar-lhe umas quadras? E desata a escrever! Aqui fica a lição simples e eficaz! A lembrar que o fim é aquilo que resta. E aquilo que resta é sempre o início de algo feliz! É dia frio e muito cinzento e o que mais se ouve é o som do vento. Não se vê

Ler é escolher!

Mia Couto, escritor moçambicano, e sempre atento às questões da Literatura como fonte de Humanidade, desenvolveu várias questões interessantes no âmbito de um congresso de Leitura, realizado em Campinas, e cuja intervenção ficou conhecida pelo título «Quebrar armadilhas».  Uma dessas ideias que me apraz retomar aqui é a questão da Leitura, propriamente dita. Como profissional da Língua Portuguesa e amante incondicional da linguagem literária, sinto uma terrível dor quando um aluno ou um filho, um amigo ou um familiar me diz que não gosta de ler e não lê. Eu costumo responder que, provavelmente, ainda não encontrou o seu livro ideal, mas, para o encontrar, é preciso ter a persistência necessária para ir procurando. E aquilo que mais inquieta é saber que quanto menos se lê, menos se tem capacidade para escolher. É esta uma das ideias constantes nesse discurso de Mia Couto que me cativou. A palavra «Ler» vem da palavra latina «legere» que quer dizer «escolher». Daí que exista ainda a

Cuidado! Os ouvidos têm paredes!

Ora, de um lado! O protagonista deste lado são todos os que habitam aquela rua. Um rapazito de onze anos que tem uma doença rara e a sua família que sofre. Um grupo de camponeses que se esfalfam a trabalhar e ganham pouco, mas são felizes. Um indivíduo de temperamento depressivo que passa a vida a gritar com os filhos. Uma dona de casa azafamada que se desdobra também em limpezas fora de casa. Uma elegante rapariga que faz torcer o pescoço aos que passam por ela. O merceeiro que decidiu instalar-se na mesma rua que o padeiro para benefício de todos que, assim, já não têm de se deslocar ao centro da vila. Há afazeres domésticos e profissionais que agitam esta gente, há amores e desamores, zangas e disparates, fofocas, exageros e suavidades. As casas foram construídas umas ao lado das outras, contíguas, portanto. São casas rasteiras de muros baixos e sem sebes. Há portões quase sempre abertos e todos se conhecem. À noite, as portas fecham-se e as janelas descem as suas persianas, mas t

Pedra sem musgo

Viro-me de um lado, viro-me do avesso agito-me nesta cadeira, enrolo os cabelos entre os dedos, apoio o queixo nas palmas das mãos. Resmungo! Mas pouco… Esta manhã, deixaram-me, em cima desta mesa onde escrevo, um bilhete, um pequenino bilhete… e fugiram. As ideias mais tenebrosas e ruins fugiram de mim. Teria sido um ato inteligente tê-las cativado, ter-lhes dito ao ouvido, em jeito de segredo, que me faziam falta, que eram o motor da minha inspiração. Ter ideias suaves é uma benção.  Mas ter só ideias suaves é uma monotonia! Vão-se as ideias ruins e fica um sabor agridoce... Resta apenas um esboço sem cor. Fica a pedra sem musgo! Mónica Costa

A trabalhar?!!

Ela pertencia àquele grupo de gente que trabalha, mas parece que não trabalha.  Por dois motivos muito claros: a matéria do seu trabalho é mágica e porque este tipo de gente gosta tanto do que faz que até parece que gosta mesmo.  E este facto cria, em certos indivíduos, uma inveja miudinha!  - Como é possível tirar-se prazer do trabalho?!! E lembra-se de um seu amigo que ganha a vida a pintar! Imaginem! É o seu trabalho! Cada quadro que vende são uns milhares de euros! (E esta pequena informação só foi incluída neste momento narrativo para tornar mais credível a ideia de pintura como um trabalho. É que há pessoas que só ouvem quando se lhes fala em números. Para esses, trabalho é sinónimo de números, rendimento, milhares de euros).  É neste momento que um desses indivíduos corroídos pela inveja miudinha se aproxima: - Olá!  - Olá!  - Tudo bem?  - Tudo bem!  Conversa curta e de circunstância! Depois destes preliminares, atira certeiro e irónico: - Descansas?  El

Uma malga de marmelada que é muito mais do que uma simples malga de marmelada!

Este texto que, hoje, aqui exponho, é um convite aos sentidos. Há cores,mas sobretudo cheiros e sabores e sentimentos. O palco deste texto é uma cozinha.  A cozinha é um dos espaços do outono. Não é uma cozinha branca clean como anunciam os catálogos do Ikea, mas um espaço tépido e doce com mesas de madeira antiga e toalha aos quadrados a fazer lembrar o tempo das nossas avós. E aqui fica a primeira referência sensorial.Já se situaram em termos visuais? Muito bem! Não há cadeiras nesta cozinha, só bancos toscos, abóboras e hortaliças espalhadas em cima da mesa e caixas, no chão, com fruta; figos, castanhas, diospiros, tangerinas e avelãs. É um lugar perfeitamente desarrumado porque há gente feliz que cozinha. Estão a sentir uma ligeira corrente de ar? Vem da janela com as suas cortinas de renda de branco imaculado que separam a luz interior aconchegante do exterior outonal acastanhado que se debruça em curiosidade por tudo o que de maravilhoso acontece deste lado onde estás.  Eu t

É assim que a ação se simplifica

Dou cabo disto tudo num instantinho! Esses montes destruo-os à picareta; E esses caminhos em serpente estico-os em linha reta; Atiro por terra aquele sol; E esse silêncio aterrador quebro-o com um grito; E viro fogo! E esse fogo se expande em degraus até ao céu. Mónica Costa

Sem algazarra ou conversa fiada

Há um eu que insiste em mim O próprio eu muito mais forte que o eu que mostro todos os dias. Um eu com as suas tranquilidades outras vezes com suas fragilidades em mim nas suas alegrias e junto do meu próprio cheiro. O eu próprio em mim! Há um eu que insiste em mim sem algazarra ou conversa fiada Um eu fundido na sua própria voz sem artifício e sem maldade Um eu que sabe o que quer! Mónica Costa

...e adormeço finalmente...

1, 2, 3, 4, 5, 6 carneirinhos. 7, 8, 9, 10 carneirinhos… Só gostava eu de saber quem inventou esta de contar carneirinhos!!  Mas há uma outra técnica, ainda mais estranha do que esta. É uma técnica meditativa que consiste em fixarmos a nossa atenção num determinado som. Fecha-se os olhos e fixamos toda a nossa energia nos pequenos sons do dia. Neste caso, da noite. Ping, ping, ping, ping… (Eu não sabia que a torneira pingava tanto! Que gasto! Amanhã tenho de ver se alguém trata deste assunto, pois qualquer dia não tenho dinheiro para pagar a fatura da água!)  E agora, que me concentro nos sons da noite, é que reparo (como nunca tinha reparado) na quantidade de pequeninos barulhos: o bébé do 4º direito chora tanto! E nunca tinha reparado que até há um galo que canta à noite!! Os cães ladram que se fartam lá ao longe e ainda há grilos no campo aqui ao lado!! Até os móveis do quarto parecem que ganharam vida, rangem portas e gavetas, parece que se estilhaçam madeiras, chiam baixinho

Linguagem-pele

Estas imagens com cheiro a terra molhada, depois de um dia quente de verão, são palavras que ganharam nariz. E as palavras escritas com tinta destas janelas abertas em espanto são a bela linguagem dos olhos. E essa linguagem ouve uma música que vai aparecendo suave pelo desejo que ali soasse em palavras-ouvido. E toda esta linguagem é pele com sabor a  boca e são palavras mãos que tocam. E toda a linguagem é pele que ganhou dedos. Mónica Costa (inspiração Roland Barthes)