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...e adormeço finalmente...

1, 2, 3, 4, 5, 6 carneirinhos. 7, 8, 9, 10 carneirinhos… Só gostava eu de saber quem inventou esta de contar carneirinhos!! 
Mas há uma outra técnica, ainda mais estranha do que esta. É uma técnica meditativa que consiste em fixarmos a nossa atenção num determinado som. Fecha-se os olhos e fixamos toda a nossa energia nos pequenos sons do dia. Neste caso, da noite. Ping, ping, ping, ping… (Eu não sabia que a torneira pingava tanto! Que gasto! Amanhã tenho de ver se alguém trata deste assunto, pois qualquer dia não tenho dinheiro para pagar a fatura da água!) 
E agora, que me concentro nos sons da noite, é que reparo (como nunca tinha reparado) na quantidade de pequeninos barulhos: o bébé do 4º direito chora tanto! E nunca tinha reparado que até há um galo que canta à noite!! Os cães ladram que se fartam lá ao longe e ainda há grilos no campo aqui ao lado!! Até os móveis do quarto parecem que ganharam vida, rangem portas e gavetas, parece que se estilhaçam madeiras, chiam baixinho as pernas da cama! Uau! Quanta vida nesta noite!
Vou fechar com mais convicção os olhos! Tanta força que até dói! E vejo agora pequenas manchas azuis e roxas que se espalmam bem à minha frente…
Lembrei-me, agora mesmo, que há uma outra técnica para relaxar. Não se pensa em nada! De olhos fechados, tentamos imaginar uma parede branca ou um ponto branco. Ai está! Acho que já consigo enxergar um ponto branco e vai crescendo diante de mim. Mas eu nunca gostei de branco!!!!!! Eu gosto é de azul… e aparece o céu! Faz-me lembrar uma determinada altura da minha infância, quando eu gostava de armar barraquinhas no jardim com lençóis. Ficava ali esparramada no chão a ver o céu e as nuvens a deslizar harmoniosamente. (Nem sei como tinha tanta paciência!) Eu nunca gostei de campismo!! Eram formigas por todo o lado, uma dor desgraçada nas costas…enfim! Como agora, exatamente, como agora. Dor de costas! Um dia sentada à secretária… e, por falar em secretária, esqueci-me de acabar o tal relatório urgente (como é possível eu andar tão desconcentrada!). 
Não será cedo demais para eu estar a contar carneirinhos? Se calhar é por esse motivo que não consigo adormecer! E esta almofada não ajuda em nada! É tão desconfortável! Vou-me levantar e acabar o tal relatório! 
Eu não acredito! Os meus olhos não abrem! Será que morri? Será que vou voar e vou direitinha para o céu?! Ou será que já estou a sonhar acordada? Não, sonhar com correrias e levantar voo, não! Já estou farta! Se calhar, o melhor é mesmo não adormecer! Vou ficar parada, de olhos fechados e vou ver, com os meus olhos fechados, um determinado espaço onde algo ficou por resolver. Assim se vive nos meus subúrbios. Normalmente, há lá luzes e estradas, não há som e há pessoas. Pessoas que se misturam aos pedaços: o riso de uma associa-se aos gestos de outra que combina com o cabelo daquela e mais os ombros daquele… 
E entre o espaço da minha memória e o espaço da minha imaginação há uma máquina que trabalha até altas horas da madrugada. Esta máquina arranca sonhos que se arrastam!
Parece que o meu corpo vai descolar que nem um avião. Já vejo lá em baixo a minha almofada e não está lá a minha cabeça!! E, num instante abençoado, sinto, exatamente na fronteira entre o sono e o despertar, um espaço onde me instalo confortavelmente e deixo-me levar… 
…e adormeço finalmente!

(Os  distúrbios do sono já atingem cerca de 45% da população do planeta, segundo a Organização Mundial da Saúde, o que configura uma epidemia)

Mónica Costa
(foto retirada de https://rockntech.com.br)






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