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Conde Drácula

A Miúda dormia inquieta.
Partilhava uma cama-sofá na sala com a irmã e, nessa noite, já tinha adormecido com algum temor: o Pai ía ver um filme. Não um filme qualquer, um filme de terror com vampiros!...o Pai gostava.
O imaginário da Miúda há muito que andava em sobressalto com estes monstros que, para ela, eram muito reais. A noite era sua inimiga!
Após o jantar, certificou-se se o filme era para ser visto. A resposta fora afirmativa e nada do que ela pudesse dizer demoveu o Pai de alterar os planos.
O ritual de deitar foi penoso. Todo o seu ser tremia com a antecipação temerosa de sonhos escuros e  de personagens de preto, vermelho com dentes aguçados.
Acordou embebida em suor e, ainda meio estonteada, abriu os olhos e viu...Viu o vampiro a furar o pescoço de uma donzela alva, as presas sugando-a exangue.
O Pai, de costas, não se apercebeu mas a Miúda não mais dormiu.
As horas demoraram a passar.
Sonolenta, tomou nota do desligar da televisão e da escuridão profunda. Os olhos, querendo fechar-se, eram escancarados à força e o alvorecer tardava, tardava, tardava.

A aurora finalmente deu sinais e a Miúda fechou os olhos. Adormeceu profundamente, fruto de tensão esgotante.
Brrrrrrrrrrriiiiiiimmmmmmmmmmmmmmmmmmmm...Saltou e esbugalhou os olhos: ele vinha para a sugar! Pânico...e, num frenesim louco, escudou-se com a almofada. Apertou-a bem ao pescoço e rezou um Pai Nosso e uma Avé Maria. Ele não lhe tocaria!
...a irmã mirava-a de forma estranha...Arre! Tinha sido o despertador!
Não gostava de ser apanhada num momento de fraqueza, afinal era a irmã mais velha e, portanto, mais forte e destemida.
O rebuliço da casa a acordar esmoreceu temores e fragilidades...O cheiro a torradinhas fresquinhas fez a malta saltar da cama. Era dia!...nada havia a temer.

A visão do pescoço ensanguentado nunca mais abandonou a Miúda. Ainda hoje não gosta de filmes de terror e, quando mais perceptiva, o Conde Drácula, era esse o seu nome, consegue transportá-la àquela noite que formatou o seu imaginário jovem.



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