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A mostrar mensagens com a etiqueta Mónica Costa
a minha vida é verdadeira paleta harmonia de azuis que me alimentam e confusão de cinzas que me atormentam por isso os meus poemas são por isso a poesia não é pincel que se encomende é a arte da vida que se impõe, desenhando-se boa e má em traços finos e delicados, em traços rudes e pesados por isso viver não é andar na monotonia dos passos medidos é conseguir pintar com olhos de fogo é caminhar silenciosamente é sentir um peso no lombo é transformar em leveza o vento que nos derruba Mónica Costa (fratal de Maurício Macondes)

Cuidadooooo... plof!

Estar assim desprendida numa rua qualquer faz com que se dirija o olhar para os mais banais pormenores.  Chuva miudinha em manhã de Carnaval. E ía a gente sem guarda - chuva na esperança da chuva passar. Havia foliões à espera da folia que nunca mais chegava. E era vê-los de collants coloridos e manga cava, óculos rosa choque e cabeleiras de espanto, caras em Ó de quem tirou dia de folga para se mascarar das máscaras de todos os dias.  E eu que estou assim desprendida e sem collants coloridos, arrisco-me a ganhar imunidade diplomática. E eis que atinjo uma menininha vestida de princesa. Um simples vestido tão fino para tão chato dia de frio. A miúda, pensei, deve estar a congelar! Mas, em vez de congelamento, o processo a que assisti foi muito mais espetacular! A criança começa a correr e evapora-se por entre as gotas finas da chuva. Plof! Um banal pormenor! Desaparece que nem feitiço de fada madrinha ou bruxa maléfica. Fica apenas no chão uma coroa em tons prateados e uma cabelei

E por cada hipótese levantada, há uma esperança!

Se retrocedermos no tempo e nos fixarmos naqueles dias em que existíamos enquanto gente com apenas alguns centímetros, facilmente nos lembramos que, com essa altura, não pensávamos em nada de transcendente. Nada esperávamos porque tudo tínhamos de essencial. Vivíamos muito próximos do chão, mesmo pés no chão em contacto direto com a terra, absorvendo a energia mãe que era a prova das coisas que não víamos, mas sentíamos. Os dias não eram compridos nem curtos, eram dias, simplesmente. Os dias não eram bons nem maus, eram só dias à custa de brincadeiras. Nada de transcendental. À medida que os centímetros nos foram acrescentando tamanho, os dias começam a ser contados e sentidos como compridos ou curtos. Na maioria dos casos, tornam-se curtos, demasiadamente curtos para tudo o que se quer fazer do que se vem descobrindo. Deve ser por isso que a noite começa a ganhar, nesta altura de narrativa, um fascínio peculiar porque acrescenta minutos ao dia, esperando-os compridos. E quem fala e

Há dias assim... sei lá

Há dias assim - assim do avesso em que se deve envergar um caminhar novo e desajeitado sei lá…trocando o número dos sapatos, por exemplo ou exibir um fato diferente, escandalosamente rasgado só porque se cismou revelar os omoplatas Há dias assim - assim fantásticos em que não se deve chegar a lado nenhum a tempo e ficarmos parados brincando em tapete rolante a marcar passo embevecidos pelo lado de dentro Há dias assim – assim aéreos em que sei lá… se deve respirar livremente só porque sim, livre de indícios e de marcas correndo a sorte de nos encontrarmos de contentes Há dias assim sim em que aprendemos que renasce algo em cada pausa! Mónica Costa (foto de Miguel Faifa)

É tudo uma questão de sobrevivência partilhada

Todos nós fomos jogados para um mundo sem o conhecermos e sem sabermos exatamente para o que vínhamos. Até há quem sinta, inclusivamente, vontade de pedir contas em tribunal aos pais que tomaram essa decisão fatídica sem pedirem permissão ao próprio. Mas a verdade seja dita: se fossemos informados do conhecimento deste mundo e para o que vínhamos, ninguém, com certeza, arriscaria a aceitar tal desafio.  É por isto que nós sentimos necessidade de proteção, pois nascemos tão sem aviso, completamente indefesos que nos agarramos imediatamente a quem nos possa deitar a mão. E é nesse preciso momento em que ainda mal abrimos os olhos, que começamos, supostamente, a amar e a confundir o amor com o interesse. Alguém aparece para nos deitar a mão e, por arrasto, vem a felicidade, o bem-estar e o conforto. E isso gera um sentimento de dependência feroz. É o reflexo de Pavlov que se instala: tu chegas, eu começo a ficar confortável! E o nosso cérebro pede cada vez maior compensação. Da mesma f

Socorro!

suspeito que é só dar um nome ainda que duvidoso ou apagado às coisas que tão mal nomeamos e nunca entendemos por falta de coragem ou exaustão um qualquer nome que nos sossegue e diga «É assim e mais nada, está catalogado!» um qualquer que nomeie a maleita e a cure de rompante e, se não sair palavra, que saia ao menos uma silaba tímida mas pungente é que se não dou nome a isto, já nem sei o que sou ou faço… lavar, secar, arranjar, dar comida ao cão emprestar as forças ao fatídico sabão atirar com a panela ao chão em dias não sair pela janela para apanhar a roupa ainda molhada estar sempre de plantão sem ter tempo para nada… Socorro! que alguém me traga a leveza de levar para casa no saco das compras de todos os dias um único nome que seja a solução Mónica Costa (foto de Ben Hopper)

Querido coração

Querido coração: Aqui estou eu entalada em buraco fundo, enxotada deste mundo E hoje, tal como ontem, dormi esmagada pelo sobressalto em que me afundo. Em sonhos, só me vejo empurrada de um alto e desfeita em trambolhão Fecho os olhos e vislumbro vultos em confusão a estilhaçar-me o corpo com arpão. De dia, em correria desmedida e calada na corrida pelo medo de protestar perseguem-me figuras imponentes aos pontapés, fazendo-me rebolar. Sinto uma mão gigante entornando ameaças, sete pedras em vez de versos Ando de olhos nos pés, adotei a tristeza como modo de ser. E aqui estou eu, a debater-me em vão, ordenada a uma resignação calada Atrás de portas que abrindo assustam, fechadas são cicatrizes envergonhadas. Esta é a minha sina, é solidão desmedida, não há lei que me acuda O melhor é resistir, não criar ondas nem pensar sequer em ajuda… Ninguém quer saber, o melhor é aguentar devagar... por amor…  (ah! louco coração!) Mónica Costa

Menina terrível!

Terrível! És menina terrível! Foi cair de bruços mesmo rente ao chão enlameada até aos ossos e ficas com essa cara de quem está prestes a bambolear as pernas para o ar fazes-me lembrar os cães quando sabem que fizeram asneira e continuam abanando com a cauda… Eu sei por que ficas de nariz encostado à terra é porque sabes que és capaz de te virar de costas num instantinho e, já que ali aterraste (nem sei se de propósito…), aproveitas para admirar o céu estrelado… Continua, menina terrível! Continua! Mónica Costa (Desenho de Alina Dorokhovich)

Caiu!

Hoje deixo cair aqui uma palavra: Flor.

Uma Maria Pires mais propriamente

E assim se optou por um determinado caminho. Escolhas que afastaram pessoas e levaram-nos a outras. Escolhas que nos fizeram perder algumas oportunidades, mas ganhar outras. Vou falar-vos de um caminho que não estava nos meus planos – Izeda. Terra pequena, pacata demais! E lá fui encontrar a Conceição. Ganhei uma oportunidade. Sim, há uma Conceição na minha vida. Uma Maria Pires mais propriamente. Minha amiga! Mulher decidida! Singular ligação! Uma riqueza! Age com retidão e franqueza! Em vez de ficar numa secura atroz, como de resto era política generalizada do local onde nos encontrámos, abria a bocarra e desatava a espingardar verdades.  Incomodava porque trabalhava com a energia típica dos loucos e sonhadores. E este último pormenor fazia, para mim, toda a diferença. E abraça como ninguém! Daqueles abraços de braços abertos de quem está habituada a abrir as portas de sua casa e convidar à entrada sem hesitações. Acontecia quase sempre aparecer, logo pela manhã, com uma energia e

crer, ver, escrever

Um pequeno, mas eficaz instrumento (rudimentar, diga-se de passagem) chamado Lápis. Diz a História que o lápis já se impôs de forma implacável – e era azul. E um outro elemento se lhe junta, também eficaz e algo rudimentar – o caderninho! O meu caderninho que é a minha companhia rudimentar para todo o lado! Há quem defenda os formatos digitais, mas eu sou apologista da escrita à mão, do sarrabisco, dos esqueletos de ideias em papel que vão tomando forma à medida do risca e torna a riscar. Quando coloco, a jeito, este meu lápis, ele é capaz de trejeitos hilariantes que fazem escorregar, para este meu caderninho, desenhos que são letras e que se vão combinando em desenhos que são palavras. E essas palavras são o reflexo daquilo que me vai no espírito, acionadas pela minha mão abusadora que tudo concretiza. Às vezes, fico até perturbada por ver este bico de lápis desbravar tanto! Caio em mim, por vezes, e, outras tantas, faz com que caia nos outros. E todos eles entram neste caderninho d

Sei que vives sozinha, mas eu não posso!

Pois, pois, à janela… com grande angústia, a assistir à passagem acelerada da sua vida monótona e dos carros e dos camiões, barulho ensurdecedor das motoretas que já nem ouve. Esta velha pariu cinco filhos. No tempo em que ter cinco filhos era coisa de coragem. Agora, não tem ninguém que tenha coragem a não ser eu própria que a vejo todos os dias. E há já muito tempo que eu costumo reparar naquela velha à janela. Todos os dias, ao levantar-se às seis, vai religiosamente à janela ver se ali continua a manhã. E a manhã tem estado lá sempre. Ainda não chegou o fim (e respira de alívio!). E eu vejo-te daqui deste alpendre. Nunca te vou visitar porque não posso. Tenho coragem, mas não tenho tempo. Sei que vives sozinha, mas eu não posso! Tenho o meu tempo tomado por completo. Agora que te vejo daqui, consigo adivinhar essas tuas faces rosadas e luzidias de há largos anos assim como uns ombros largos que se prolongariam por braços espantosos, assim como uma boca deliciosa e uns peitos dig

Poderosa alfinetada que rebentou o balão...

Era assim que passava por entre a maioria das gentes que circulava naquelas ruas da cidade. Corpo de água, cabeça de ar.  Havia algo de etéreo na sua figura esguia, de cabelo esguedelhado e claro. Babava-se constantemente e amparava a baba com um lenço algo sebento. Ficava assim estática, cheirando o vento com olhos de espanto, olhando a gente por dentro no meio da rua. Os dentes podres, as unhas pretas. Causava incómodo e, para tranquilidade de todos, chamavam-lhe a louca. Debaixo do braço carregava sempre uns galhos secos, levava lenha para onde não tinha fogo onde arder. Teimosa e malcriada, gritava, por vezes no meio daquela gente toda, e os gritos atroavam as esquinas e assustava quem passava limpinho. Parecia um turbilhão de águas salgadas e agrestes! As gentes pareciam formigas solenes em procissão, encurralados até aos ossos, mas ela… liberta de jugos.  Um dia, cruzou-se com um galante de colarinhos lavados e exageradamente engravatado. Jeitosinho até às pontas dos pés! El

Acredita!

Há uma certa melancolia, qualquer coisa de despedida… quando finda um ano! O sentimento da não duração. Uma espécie de resignação, um abatimento, um balanço mal engendrado do ter e haver, uma certa subtração…Há um abotoar do casaco e um enfiar de mãos nos bolsos. Há mesmo quem procure, como único refúgio, os ditames de um horóscopo favorável que transforme o ano seguinte numa possível segunda oportunidade… algo a dizer-nos «falhaste! tenta outra vez» e é como se adquiríssemos pós mágicos que transformam a vida num ciclo recomeçado, mas sem medo. Séneca dizia «Onde não há esperança, não há medo.». Portanto, tenhamos medo!  Há uma certa alegria, qualquer coisa de mágico… quando se inicia um novo ano! Uma esperança na mudança para que nos aperfeiçoemos, coragem para assumir o inesperado, o inédito, a surpresa, o novo olhar sobre as coisas e as pessoas. Só a capacidade de pensarmos que aquilo que aí vem vai ser muito melhor do que aquilo que já passou, é vida! Sermos capazes de uma viag

homenagem ao texto de jeito que nunca chegou a nascer

Ainda vais a tempo… (desafia o corvo) Pega nesta caneta e escreve sem anestesista! Escreve um texto de jeito por uma vez na vida Exibe-te em jeitos de malabarista Transforma o meu presságio em golpe de sorte, em jogo de palavras, em ás de ouros. Se conseguires, tiro-te o chapéu! Mónica Costa (imagem de Soisick Meister)

Nascimento!

Eram três, três estrelas e meia numa manhã clareada e sem fim, pautada pelo ritmo da dor que ora chegava ora abalava. Depressa se transformaram em dez, dez nuvens numa manhã que rasgava a janela. Eu estava na cozinha só à espera. Eram cinco, cinco minutos, de cinco em cinco minutos. A ansiedade estalava as paredes silenciosas da casa. Eram vinte e quatro, vinte e quatro dias da manhã do dia vinte e quatro! Pesava a cabeça de uma criança que parecia puxar-me para o chão, os rins pareciam inchar. Urgia uma partida, mas controlei-me: é que o amor de cá de fora suplantava a dor que vinha de dentro. Transpirava a calma do mundo… inspirava, retinha e expirava levemente. Parti! De repente, tudo se apressou. Uma porta, uma porta se fechava. A dor intensificava-se, as águas brotaram, tudo se abria à sua chegada. E eu passeava por entre belas paisagens com montras de brinquedos – tudo cheirando a natal. De quando em vez, colava-me à parede para aguentar a dor. Exausta, deitei-me. Era uma vez, m

Natal 4

Abre, abre fogo! Fica aí na tua trincheira que me dói Assobia, assobia! Faz de conta que não dás por nada Afinal tudo o que importa é que é natal E o que de grave e útil existe, está do outro lado onde desfilam rostos calados colados ao chão. Repara! A camisola tem nódoa e está rota O aspeto é de pobre que não se endireita Cheiro a mofo e a tédio… A tua camisola está lavada Não tem um buraco sequer… Abre, abre fogo! Mas não te esqueças O teu aspeto também é de pobre porque afinal somos todos valas enlameadas carpimos mágoas guardadas em arcas fechadas embora alguns exibam faces de gumes perfeitos escondidos nas suas trincheiras. Mónica Costa (imagem retirada de https://plus.google.com/)

natal 3

Estava a caixa encostada atrás da porta há um ano. Tanto pó! E tu a protestares! Havia já uma considerável camada de pó. Lá dentro um pinheirito de plástico todo encolhido. Foste lá buscá-lo para quê? É todos os anos a mesma coisa. Já sabes o que te vai acontecer... Tiras o pinheiro da caixa cuidadosamente e ficas esticando nervosamente as hastes verdes para cima e para baixo para dar corpulência ao pinheiro raquítico. De repente, reparas que o pinheiro está torto e não se endireita, falta-lhe uma das partes do tripé. Não pode ser! Comprar outro está fora de questão! E tu a protestares! Portanto, vai-se à dispensa e traz-se o escadote. Colocas-te no cimo da escadaria e arrebitas o nariz para cima da prateleira mais alta onde existem umas ripas de madeira que poderão servir de pé disfarçado para esta árvore que todos os anos dá sinais de fraqueza. Esticas-te um pouco mais e… caíste? Oh, não! Está tudo bem? Sempre o mesmo! Sempre aos tombos! Não tinhas prometido que ias melhorar quanto

Natal 2

Acreditar no pai natal é magia Deixar de acreditar no pai natal é desilusão Não acreditar no pai natal com veemência é alívio medíocre… damos ar de fortes e de seres orgulhosos pela perda de virgindade porque agora experientes e sábios … mas desconsolados e medíocres ninguém nos avisou que a única coisa que nos vale é a magia!... Mónica Costa (imagem retirada de https://www.bioorbis.org)

Natal 1

Vai aparecendo o natal devagarinho e choca…Vem camuflado… diluído na hipocrisia social que nos abafa! Não o sentimos verdadeiramente e, no entanto, construímo-lo subtilmente… e vai sendo engolido pela engrenagem económica. Corre o povo à procura do presente ideal!!!! E há sempre um anjinho que, a medo, se aventura a recordar: «Natal é nascimento!» E o povo continua na sua azáfama consumista… e faz de conta que nem ouve. Desmontar a máquina dá trabalho… é lutar contra a corrente. E, por descargo da consciência, desata-se com uma série de campanhas solidárias para os necessitados que são de todo o ano. Porque é este o tempo da fome e da vulnerabilidade!... Não dos que passam fome todo o ano (esses já estão habituados…), mas a vulnerabilidade de quem consegue estar em paz nas suas casas quentes sem pensar nos da rua frios. Mónica Costa (pintura de Rafael Sanzio)