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Não, vou ficar!

João olha o mar. 
Está sozinho perante a imensidão do oceano. Veio para refletir. Pensar na vida. E respira. Nunca esta ação deste sujeito poderá ser interrompida por qualquer virgulazinha intrometida. A não ser que…. 
…pois…. aconteceu o que João não desejava!
- João, olha o mar! (Aqui está! O João, o mar e a mãe do João). 
A mãe do João que daqui a nada estará a recomendar-lhe: «João, recua! Ainda te afogas!» Ela não entende que o rapaz tem quase vinte anos e precisa de observar o mar a sós. O certo é que a virgulazinha decidiu intrometer-se entre este sujeito e o puro ato de contemplação. E lá se foi o ato contemplativo! 
Ai! A vírgula! Esse reparo pequeníssimo e pendurado na linha da frase a tentar resistir, fazendo-nos lembrar que os pequenos pormenores existem e marcam a diferença sem chamar a atenção. Às vezes, até nos esquecemos que ela existe ou colocamo-la num lugar inadequado. Ela lá vive angustiada mas sobrevive. Como agora…devia ter aparecido antes da palavra «mas»! Decidiu afirmar-se neste discurso e desaparecer em jeito de rebeldia de quem desafia os teóricos que defendem a filosofia de colocar as vírgulas como forma de articulação quando a articulação já está por natureza efetivada pela presença da conjunção coordenativa.
- Não chega já?!! – lá continua a mãe desesperada por ver o seu filho tão absorto.
E é agora que o João pondera também o uso da vírgula ou o seu imediato esquecimento.
E a mãe continua:
- João, ficas ou vens? Já se faz tarde!
E o João pondera o uso da vírgula… ou o seu esquecimento. Será uma resposta para evitar confrontos, sem vírgulas? do género «Não vou ficar!» ou uma resposta tempestivamente decidida?

Diz ele: - Não, vou ficar!
Ficou com a vírgula e com o mar.

Mónica Costa







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