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hbjjgfttruuuommdndhtiiiiiiiiii

Nove horas da noite e uma nesgazinha de lua embaciada na janela. A média luz, lá vou eu formulando palavras cobertas do dia que passou rapidamente. E porque continuo sem saber como se constrói um livro, vou-me entretendo com textos dispersos. Começo por colocar a mão a jeito neste lápis tosco, que já vai a meio, e pousá-lo nesta folha já gasta de tantas riscadelas. Ao princípio, julgo sempre as letras separadas e, à medida que as vou juntando em palavras, fico com a sensação de não ter escolhido as melhores. Umas aparecem possantes e triunfais, outras são arrastadas para dentro de um texto sob protesto. É o princípio do prazer do inesperado. 
É que isto de juntar consoantes e vogais é como pôr um carro em andamento. Se se pensa demais, confundem-se os pedais. Portanto, para que este carro ande, é necessário, em primeiro lugar, deixar fluir. (De repente, e nem sei porquê, lembrei-me do meu instrutor de condução que me mandava parar o carro bruscamente só para ver como é que eu reagia. Eu sabia que eram três peças para dois pés: o acelerador, o travão e o equilíbrio do arranque suave e das mudanças ponderadas de velocidade. Eu sabia! Em teoria, pelo menos! Na prática, pensava muito, trocava os pés pelos pedais e lá ía o carro aos solavancos como que engasgado.). Tal e qual como escrever, às vezes! Engasgamo-nos nas palavras que são o reflexo dos sentimentos. E, de tão entusiasmados ou baralhados, trocamos as letras, que é como quem diz, tantos são os pedais para apenas dois pés. Escrever é, para muitos, teclar. É como usar pedais de mão!!  Há letras que juntas funcionam que nem aceleradores, outras são o travão. E depois, há aquelas que funcionam como o arranque suave para mudanças serenas de velocidade! São aquelas que, por vezes, se teclam ao sabor do desnorte. Confesso que já me passou pela cabeça, atirar vogais e consoantes à sorte para ver se se transformavam em palavrinhas de elogiar um texto ou alguém.  
Querem ver? Vou desafiar o teclado! E perdoem-me se este carro começar a engasgar! Vou deixar-me rodopiar. E qual alma ansiosa ou suave, vou carregar à sorte neste teclado para ver no que dá. Aqui vai:
Mmmjjhnhjuuuuu
De repente, fez barulho, são sonoras estas letras baralhadas assim do nada. Querem elas afirmar-se como palavra! Pretensiosas! E vieram em jeito manso. Sempre tive algum receio em relação a este tipo de miscelâneas que se abrem em abracinho tímido de consoantes bilabiais qual interjeição de doçura! «mmmm…». Porque eu sei que estas vêm seguidas de uma dupla constritiva que exige a devida elevação da língua em direção ao palato. Vêm cheias de «jjj» e «nhnhnhnhn». O certo é que, nestes casos, tudo termina de forma perfeita num carreiro de vogais fechadas como braços que se fecham e apertam.  E tudo se compõe! No fim, soa bem, não soa a palavra, mas soa a abraço!
Afinal, o carro ainda funciona e aventuro-me a teclar segunda vez:
Y&Iuruhyurcuujottttuousyuofffy
Ui! Há aqui uma certa desarrumação, um certo partir de loiça, não há? A pouco e pouco, os sons começam a fazer mudanças de velocidade. Neste caso concreto, diria até que é um partir a loiça toda e a dois (Y&I). Bem, bem… (ou mau, mau, Maria!). Estas vogais e consoantes que se juntaram afirmam-se de forma poderosa. Não de uma forma tão sonora… vou mesmo dizer que chegaram de forma algo sussurrada. São vogais terríveis que se fecham «uuuuu» e se encaixam vibrantes nos alvéolos em cocktail de res, ccc e tttt pelo meio, a chamar a língua ao dente. E uns efes finais de fofura acompanhados de um Y doce em exercício lábio dental. Que maravilha!
Está visto! Há letras que juntas funcionam que nem aceleradores, outras são travão. E depois, há aquelas que funcionam como o arranque suave para mudanças serenas de velocidade! E dedos que as fazem nascer!
Agora, chegou a tua vez… tecla para ver no que dá!

Mónica Costa




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