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Kindergarten - O Cemitério de Pássaros

Pequenos narizes colados ao vidro das portadas e olhos bem abertos.
Lá fora, o recreio estava belo. Embelezado pela neve colorida e texturizada dos bonecos de tamanhos e feitios vários, das bolas não propriamente geométricas (quem queria saber dessas coisas!!), enroladas mediante as forças de cada qual  e pelas estalactites de gelo penduradas em tudo quanto era recanto e encanto.
Nas árvores entreviam-se as pequenas casotas de passarinhos: um telhado em V invertido, um buraquinho redondo, tudo aconchegado com algodão e palhas ... o alimento, em plataforma ou em cacho, parecia favos de mel. Mas não, não era mel...eram sementes que tinham sido trazidos de casa para ajudar estes voadores, chilreadores, cantadores,..., a sobreviver ao inverno.
Pequenos flocos começaram a cair...e a espera continuava.
A condensação da respiração das pequenas bocas começava a embaciar os vidros. Não há problema!...desenham-se umas bonecadas com os dedos até vir o raspanete das Educadoras. Era tão bom, tão bom poder desafiar as "autoridades", he,he.
Acontecera!
...com os flocos, caem pássaros!
Tudo pára. Começa a contagem e as lágrimas enchem os olhos da miudagem. Era tão triste não poder ter ajudado mais. O frio vencera!
O ritual prepara-se.
Em silêncio, vestem-se os kispos, calçam-se as botas lunares, enfiam-se os gorros e pegam-se em pequenas pás. Sai-se para o recreio e, cada uma das crianças, aconchega respeitosamente um dos pássaros mortos na mão. Caminham em fila até à Igreja onde, num sítio específico, se encontrava o cemitério.
Está na hora de escavar a terra dura e gelada. Com esforço e energia, as pequenas mãos conseguem a sepultura pretendida. Os corpos frágeis, alguns entretanto já congelados, são colocados na sua última morada e cobertos. As campas são decoradas com pequenos bonecos de neve, azevinho, coroas de ramagens,..., tudo serve para dignificar estes pequenos seres.
Em silêncio, o grupo ergue-se, dá as mãos e, só então, cantam uma oração, certificando-se que os mortos possam ressuscitar e viver no Céu dos Pássaros.
O regresso é tristonho. O inverno ainda é longo.
O ritual chegara ao fim.
De regresso, e sendo crianças, rapidamente as brincadeiras afastam a dor e o pesar, mas o valor de prezar toda a espécie de vida estava enraizado. Que lindos adultos poderiam vir a ser!

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