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de nada lhe serve qualquer discurso feliz que traga no bolso

 Discursos felizes transportam-nos para cenários satisfatórios dentro dos quais nos conseguimos rapidamente imaginar enquanto personagens principais.  Discursos felizes atraem. Os discursos tristes relembram-nos da nossa condição de figurantes num verão que nunca chegou. Discursos tristes ninguém quer…

Há, portanto, coisas sobre as quais não devemos escrever. Sobre a tristeza, por exemplo. A tristeza afasta-nos das pessoas, transforma-nos em seres abomináveis. Deixamos, de repente, de ser agência de viagens para passarmos a ser agência funerária. E as pessoas não gostam deste tipo de viagem sem regresso.

É exatamente por isto que, hoje, particularmente hoje, decidi escrever sobre a tristeza. Funda e sincera. Não a do apelo ao coitadinho, mas a tristeza que é assunção das nossas fraquezas. Daquele tipo de discurso que ninguém gosta de ouvir nem ler.

E logo, hoje, neste dia preciso, no qual há um calor que é conforto. Uma luz que é alegria. Todo um cenário que tinha tudo para ser feliz. Mas lá dentro não há nada. Apenas uma sala fechada a sete chaves e uma pessoa num vazio profundo. Hoje estou triste porque vi a tristeza em pessoa. Tristeza que é inação, desalento, apatia, marasmo. Apesar de todo este sol. 

E estou triste não como personagem principal ou figurante, mas como pessoa triste ao lado de. Estou triste com. Triste por não conseguir mudar a situação. Será que o melhor que fazemos ao outro é realmente o melhor para essa pessoa? Ou será apenas, de forma egoísta, o melhor para nós mesmos? E é esta confirmação de um estado de tristeza por ver o outro num apagão completo. 

Estou triste, sim, porque vejo o outro triste e de nada lhe serve qualquer discurso feliz que traga no bolso. 

(obra de Quint Buchholz)



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