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Mensagens

Não quero ir para a escola...

Talvez se insira na rábula, bem conhecida, de "...mas tens de ir. És o Professor.", mas, prestes a sair de casa, é o que sinto. Já lá vão os anos em que, acordada antes do despertador, ruminava sobre abordagens fixes das matérias do dia. Hoje, fico com o acordar antes do despertador a pensar "Pombas!...quantos dias é que faltam para o final?". Não significa que me considere pior profissional. Aliás, creio que, cada vez mais, alcanço o patamar de "Excelente Profissional"...sem direito a créditos, como é óbvio! Isso é para os Outros, os que brilham nas fotos de grupo, de sorrisos vitoriosos (não sei bem do quê) e glamorosos, à Colgate, nova pasta anti-corrosão. Excelência por ainda andar por cá! Bem, poderia mudar de vida, poderia, ...mas isso seria admitir a vitória do "sistema" e a derrota do caminho percorrido. Assim, encorajada por cliches bonitos e de inspiração q.b., lá vou desempenhando as tarefas, sim virei tarefeira, consignadas no hor

Ah?!!

Se em vez de nos fustigarmos com antíteses que tudo confundem Ou nos iludirmos com suavíssimos eufemismos Se em vez de nos embebedarmos com sinestesias que tudo misturam Ou nos enaltecermos com exageradas apóstrofes Que tal ficarmos pelas vaporosas interrogações retóricas? Mónica Costa (desenho a esferográfica de David Perez)

A caixa de Pandora

Eu conheço um pintor fantástico, cujo nome não revelo aqui por não lhe ter pedido autorização, que costuma, a par das imagens do resultado das suas obras, publicitar imagens de todo o contexto onde produz a sua arte. São fotos onde se enxerga as fases do processo de trabalho, os materiais utilizados nas diversas fases, o raio de sol que entra pela janela adentro e o gato que se espreguiça no sofá e que assiste feliz às movimentações do dono. E daquele ambiente surge um trabalho verdadeiro tão difícil e tão belo como um parto natural. E eu sei bem do que estou a falar porque já passei por dois fantásticos partos naturais. É tal e qual como dizia uma cronista que muito aprecio e cujo nome não revelo para que a curiosidade possa provocar uma pesquisa. Ela dizia que, para se criar algo de forma verdadeira, é preciso escolher um sítio vulnerável. E é de vulnerabilidades de que vos vou falar de seguida. Quase que foi declarado estado de sítio há uns dias. Um pequeno caos! E estava eu numa

conversinha da treta!

Para os sujeitos mais calados e introvertidos, esta coisinha irritante das conversinhas só veio atrapalhar. São os sujeitos de olhos fixos e vagos! Há mesmo os que se recusam a comentar qualquer tipo do que consideram apenas ser ruídinho insuportável, acrescentando-lhe apenas uma nesga de olho, um revirar de olhos com ar incomodativo, abanando ao mesmo tempo a cabeça em jeito de reprovação. E isto, já vos digo, é extremamente complicadinho de se fazer! Exige uma sincronia de movimentos muito rápidos para resultar em eficácia! E é tanto o desprezo pela conversinha irritante dos outros que  continuam formulando palavras interiores, só as deles, fechadas a sete chaves! Para estes seres especiais, as conversas são o início de um pequeno caos. Revelam interioridades, aparecem desordenadas e puras, tão verdadeiras que até assusta. Deve ser por isso que há pessoas que se revelam pouco e não querem que as descubram como tal. Pensam-se diferentes dos tais incomodativos: os palradores, uns exag

Avança!

Que ingratos somos!!! Sempre em sinal vermelho. Entardece e nós com aquele sentimento de mãos vazias e com pés de quem se aventura em caminho de lama que nos impede a pressa. Hoje deu em chover! E nós enclausurados em carros de fogo que nem a chuva apaga. Um sinal intermitente para que hesitemos. Avançamos ou desistimos? Filas de espera ansiosa e sempre em protesto. E o sinal que quase fez questão de se entornar de verde no preciso momento em que a lama impede o arranque. Parece que temos a espinha ensanguentada e os cotovelos entediados cravados nas janelas dos carros. Andamos fartos dos vidros onde se esborracham os mosquitos. Andamos em monossílabos de rima em ento, lento movimento de desalento. Sempre o mesmo cenário. A nuca do individuo do carro da frente, o rosto de trás macilento e os olhos cansados que alguém enxerga no espelho retrovisor. Colocamos em todos os sinais de trânsito verbos de estado e não de ação. Saímos dos centros caóticos e dirigimo-nos tristemente para o luga

está o caldo entornado...

Houve um tempo em que acreditava que entre as palavras e a realidade ía uma distância considerável. Aprendera que as palavras são usadas para nos comunicarmos na realidade. Mas como era difícil a comunicação! Nem sempre se achavam as palavras exatas para traduzir a realidade. Nem sempre se usufruía de um leque vocabular alargado que nos permitisse traduzir tudo o que realmente se queria traduzir. E depois havia essa tendência para a ingenuidade - não se media as palavras! E havia também essa sombra de ser mulher que é a competência máxima no que toca a sentidos figurados. E se à ideia de significado, se lhe acrescentasse a de significante, estava o caldo entornado! Fazia constantes revisões sintáticas e consultava constantemente o dicionário à procura do sentido verdadeiro. Então, o tempo foi correndo (que é expressão metafórica que não vem no dicionário!) e eu, correndo atrás dele, tantas vezes sem tempo, fui aldrabando o sistema da comunicação. Encurtei as frases (apesar de

Um tempo pelo 102º

Ontem o tempo fez eco no meu cérebro. Condensado. Atrofiado. Indeciso e, sobretudo, nublado e pesado. O dia começara cedo, como sempre. As horas foram passando, entre "Stôra, o que vamos dar hoje?", "O X está a faltar. Magoou-se em EF!", "Diga lá, vai sentir saudades nossas, não é?", ...tudo preceitos e novidades que a miudagem considera pertinente, e de importância tipo vida ou morte. O tempo arrasta-se e chega a hora daquela turma, difícil e de humores voláteis, em que a tua resistência é testada. Não sei se há limite ou se tenho limites...Limito-me a entrar em piloto automático, esperançada que a experiência condicione a reacção correcta, no momento certo. Há muito que confio neste meu GPS. Poderão pensar que parei no tempo. Pois bem, não creio que assim seja. Fui refinando posturas e abordagens...afinal a miudagem continua a Vox Populi de gerações de progenitores que me passaram pelas mãos. Vivem dramas que, apesar de mudam-se os tempos , não muda

desapareci

como era urgente, cheguei cedo, mas tão cedo muito antes da hora marcada ainda a rua estava deserta e as janelas estavam fechadas o dia prometia, mas nem calor nem nada de nada e, como dizia, esta urgência instalada! daquele tipo de urgência sem cheiro a hospital ou doença uma espécie de urgência que torna o dia mais secreto e íntimo e que nos faz lembrar que com muito pouco se constrói a confiança e havia uma janela fechada onde tu ainda dormias e eu, ali, especado de forma urgente, e em ti a esperança de repente, e por magia, aparecias! e de lá para cá, a minha vida tem sido estes instantes em que apareces e desapareces, caminhando ao meu lado cadência de onda tombando em areal branco branco a estender-se pelo azul do horizonte o nosso olhar nos pontinhos luminosos fixado e aquela água tão azul e o silêncio aquele céu tão sereno a alegrar-nos cada manhã um sol quente em nossos braços de um e de outro os lábios que não medem a distância Mónica Costa (pintura de P

Semeador de estrelas

Quando era miúda, via muitos filmes e as pessoas grandes, à minha volta, faziam questão de afirmar que eu via e fazia muitos filmes. E tentavam provar constantemente que a vida nada tem de filme, pelo menos com aqueles cujo final é feliz. Demolidora e eficaz estratégia?! De facto, tiveram alguma razão. A vida não é um filme. Mas o mais controverso é que os filmes são o fruto da vida. É nela que eles se inspiram.  E há um pedaço de caminho onde os candeeiros da rua iluminam os passos da gente que passa que me faz lembrar quase sempre um filme que vi há uns anos. E, numa espécie de vento, a única árvore que ali persiste, verga-se quase sempre com a ventania, mas nunca quebrou. É uma imagem fantástica que me faz acreditar na nossa capacidade de final feliz, mesmo quando insistem na anunciada infelicidade óbvia.  Mónica Costa (escultura semeador de estrelas na Lituânia)