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Mensagens

Socorro!

suspeito que é só dar um nome ainda que duvidoso ou apagado às coisas que tão mal nomeamos e nunca entendemos por falta de coragem ou exaustão um qualquer nome que nos sossegue e diga «É assim e mais nada, está catalogado!» um qualquer que nomeie a maleita e a cure de rompante e, se não sair palavra, que saia ao menos uma silaba tímida mas pungente é que se não dou nome a isto, já nem sei o que sou ou faço… lavar, secar, arranjar, dar comida ao cão emprestar as forças ao fatídico sabão atirar com a panela ao chão em dias não sair pela janela para apanhar a roupa ainda molhada estar sempre de plantão sem ter tempo para nada… Socorro! que alguém me traga a leveza de levar para casa no saco das compras de todos os dias um único nome que seja a solução Mónica Costa (foto de Ben Hopper)

Querido coração

Querido coração: Aqui estou eu entalada em buraco fundo, enxotada deste mundo E hoje, tal como ontem, dormi esmagada pelo sobressalto em que me afundo. Em sonhos, só me vejo empurrada de um alto e desfeita em trambolhão Fecho os olhos e vislumbro vultos em confusão a estilhaçar-me o corpo com arpão. De dia, em correria desmedida e calada na corrida pelo medo de protestar perseguem-me figuras imponentes aos pontapés, fazendo-me rebolar. Sinto uma mão gigante entornando ameaças, sete pedras em vez de versos Ando de olhos nos pés, adotei a tristeza como modo de ser. E aqui estou eu, a debater-me em vão, ordenada a uma resignação calada Atrás de portas que abrindo assustam, fechadas são cicatrizes envergonhadas. Esta é a minha sina, é solidão desmedida, não há lei que me acuda O melhor é resistir, não criar ondas nem pensar sequer em ajuda… Ninguém quer saber, o melhor é aguentar devagar... por amor…  (ah! louco coração!) Mónica Costa

Menina terrível!

Terrível! És menina terrível! Foi cair de bruços mesmo rente ao chão enlameada até aos ossos e ficas com essa cara de quem está prestes a bambolear as pernas para o ar fazes-me lembrar os cães quando sabem que fizeram asneira e continuam abanando com a cauda… Eu sei por que ficas de nariz encostado à terra é porque sabes que és capaz de te virar de costas num instantinho e, já que ali aterraste (nem sei se de propósito…), aproveitas para admirar o céu estrelado… Continua, menina terrível! Continua! Mónica Costa (Desenho de Alina Dorokhovich)

Caiu!

Hoje deixo cair aqui uma palavra: Flor.

Uma Maria Pires mais propriamente

E assim se optou por um determinado caminho. Escolhas que afastaram pessoas e levaram-nos a outras. Escolhas que nos fizeram perder algumas oportunidades, mas ganhar outras. Vou falar-vos de um caminho que não estava nos meus planos – Izeda. Terra pequena, pacata demais! E lá fui encontrar a Conceição. Ganhei uma oportunidade. Sim, há uma Conceição na minha vida. Uma Maria Pires mais propriamente. Minha amiga! Mulher decidida! Singular ligação! Uma riqueza! Age com retidão e franqueza! Em vez de ficar numa secura atroz, como de resto era política generalizada do local onde nos encontrámos, abria a bocarra e desatava a espingardar verdades.  Incomodava porque trabalhava com a energia típica dos loucos e sonhadores. E este último pormenor fazia, para mim, toda a diferença. E abraça como ninguém! Daqueles abraços de braços abertos de quem está habituada a abrir as portas de sua casa e convidar à entrada sem hesitações. Acontecia quase sempre aparecer, logo pela manhã, com uma energia e

crer, ver, escrever

Um pequeno, mas eficaz instrumento (rudimentar, diga-se de passagem) chamado Lápis. Diz a História que o lápis já se impôs de forma implacável – e era azul. E um outro elemento se lhe junta, também eficaz e algo rudimentar – o caderninho! O meu caderninho que é a minha companhia rudimentar para todo o lado! Há quem defenda os formatos digitais, mas eu sou apologista da escrita à mão, do sarrabisco, dos esqueletos de ideias em papel que vão tomando forma à medida do risca e torna a riscar. Quando coloco, a jeito, este meu lápis, ele é capaz de trejeitos hilariantes que fazem escorregar, para este meu caderninho, desenhos que são letras e que se vão combinando em desenhos que são palavras. E essas palavras são o reflexo daquilo que me vai no espírito, acionadas pela minha mão abusadora que tudo concretiza. Às vezes, fico até perturbada por ver este bico de lápis desbravar tanto! Caio em mim, por vezes, e, outras tantas, faz com que caia nos outros. E todos eles entram neste caderninho d

Sei que vives sozinha, mas eu não posso!

Pois, pois, à janela… com grande angústia, a assistir à passagem acelerada da sua vida monótona e dos carros e dos camiões, barulho ensurdecedor das motoretas que já nem ouve. Esta velha pariu cinco filhos. No tempo em que ter cinco filhos era coisa de coragem. Agora, não tem ninguém que tenha coragem a não ser eu própria que a vejo todos os dias. E há já muito tempo que eu costumo reparar naquela velha à janela. Todos os dias, ao levantar-se às seis, vai religiosamente à janela ver se ali continua a manhã. E a manhã tem estado lá sempre. Ainda não chegou o fim (e respira de alívio!). E eu vejo-te daqui deste alpendre. Nunca te vou visitar porque não posso. Tenho coragem, mas não tenho tempo. Sei que vives sozinha, mas eu não posso! Tenho o meu tempo tomado por completo. Agora que te vejo daqui, consigo adivinhar essas tuas faces rosadas e luzidias de há largos anos assim como uns ombros largos que se prolongariam por braços espantosos, assim como uma boca deliciosa e uns peitos dig

Poderosa alfinetada que rebentou o balão...

Era assim que passava por entre a maioria das gentes que circulava naquelas ruas da cidade. Corpo de água, cabeça de ar.  Havia algo de etéreo na sua figura esguia, de cabelo esguedelhado e claro. Babava-se constantemente e amparava a baba com um lenço algo sebento. Ficava assim estática, cheirando o vento com olhos de espanto, olhando a gente por dentro no meio da rua. Os dentes podres, as unhas pretas. Causava incómodo e, para tranquilidade de todos, chamavam-lhe a louca. Debaixo do braço carregava sempre uns galhos secos, levava lenha para onde não tinha fogo onde arder. Teimosa e malcriada, gritava, por vezes no meio daquela gente toda, e os gritos atroavam as esquinas e assustava quem passava limpinho. Parecia um turbilhão de águas salgadas e agrestes! As gentes pareciam formigas solenes em procissão, encurralados até aos ossos, mas ela… liberta de jugos.  Um dia, cruzou-se com um galante de colarinhos lavados e exageradamente engravatado. Jeitosinho até às pontas dos pés! El

Acredita!

Há uma certa melancolia, qualquer coisa de despedida… quando finda um ano! O sentimento da não duração. Uma espécie de resignação, um abatimento, um balanço mal engendrado do ter e haver, uma certa subtração…Há um abotoar do casaco e um enfiar de mãos nos bolsos. Há mesmo quem procure, como único refúgio, os ditames de um horóscopo favorável que transforme o ano seguinte numa possível segunda oportunidade… algo a dizer-nos «falhaste! tenta outra vez» e é como se adquiríssemos pós mágicos que transformam a vida num ciclo recomeçado, mas sem medo. Séneca dizia «Onde não há esperança, não há medo.». Portanto, tenhamos medo!  Há uma certa alegria, qualquer coisa de mágico… quando se inicia um novo ano! Uma esperança na mudança para que nos aperfeiçoemos, coragem para assumir o inesperado, o inédito, a surpresa, o novo olhar sobre as coisas e as pessoas. Só a capacidade de pensarmos que aquilo que aí vem vai ser muito melhor do que aquilo que já passou, é vida! Sermos capazes de uma viag