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Mensagens

Se soubesse como se sentem as folhas que vão ao chão. Nada quietas.

 Se encontrar uma árvore à solta, envolva-a. Provavelmente, algures no seu tronco, aparecerá escrito «Não estou perdida e vim parar às tuas mãos para que me olhes e me compreendas». É este o espírito da cadeia que agora inicio que é também um desafio para quem o quiser acolher.  Apresento aqui a minha perspetiva – poética, como sempre.  Eram as seis e um assobio melodioso aflora à minha janela. Meio surda, meio zonza, subo devagarinho a persiana para verificar a cor da manhã que insistia este despertar, muito antes da hora marcada. Ali estava. Manhã cinza. Apagada. Tudo molhado. Uma completa neblina. Não havia dúvida. Era ele sem sombra de dúvida. Revolto e fazendo barulho por tudo e por nada. Uma choradeira completa em tudo à volta.  O meu novo pátio com o diospireiro ao centro. Despido. Embaraçadamente despido. Os frutos à mostra. As folhas no chão. Nada quietas. Arrastavam-se ao som do cúmplice vento que as envolvia, tentando à pressa esconder as provas do crime. Em voz de falsete,

Mesmo muito mau!

Havia um homem mau.  Mesmo muito mau! Porque incapaz de ser bom. Mas que fazia sempre bem aos maus e aos bons  sem qualquer distinção…

o quente que se procura sempre depois do gelo da rua

por entre os transeuntes vagabundos nas praças há uma escuridão a nascer entre os meus passos prolonga-se a estadia ao frio na quase noite para acolher com redobrado prazer a chama tua o quente que se procura sempre depois do gelo da rua (fotografia de Istvan Kollath)

a luz da árvore quando cresce

Imagina que me conheces por dentro. E consegues ver o mundo de fora com os meus olhos. Não há feridas nem sendas nem pedras. Acredita! Esse mundo que vejo é bonito!

nunca

Pode ser que me sossegue de qualquer maleita Posso livrar-me da dor de dentes da dor das costas Da dor da alma – nunca - Porque me inquieta e encanta! (imagem de Sarah - Jane Szikora)

Não procures no perfume das flores a tempestade das raízes.

Quem sabe ainda vá a tempo de compor novas estrofes como quem arranja uma colcha nova para esta velha cama. Uma última tentativa que me acolha doce nesta metade do poema que, segundo dizem, é a mais agridoce das idades. Mandei arranjar as pernas por precaução  não vá a cama pirar-se a qualquer momento julgando-se jovem outra vez, à custa de tanta atenção e fiz a cama com cuidado como quem se deita nela e dei a pena ao manifesto repousando inteira em versos livres. Ajeito, por último, a almofada à cabeceira na esperança de ter menos olhos que barriga e ponho, na janela, um jarro sem querer das flores a tempestade das raízes sentir tudo isto apenas e só como o barro como quem molda a dança destas novíssimas sílabas. (*O mote foi dado por José Gomes Ferreira)

O dia-passagem para aquilo que ainda é espanto.

 O dia de hoje. O melhor do mundo. Que será ainda melhor amanhã. O dia que nos dá a guerra, mas a paz. O dia que teremos sempre à nossa espera. Minutos que ainda servem, se sentem e insistem. Música e algumas portas entreabertas se tanto. O dia-passagem para aquilo que ainda é espanto.

colocou-se na paz do tempo e demora

Colocou-se na paz do tempo e demora agora já nada disfarça em degustar o travo  - e ouvir o acorde bravo regozija-se nesta nova perspetiva do desastre e adora considerando tão doce a manhã que o acolhe todos os dias em festa Sorri! Não te esqueças! Enganam-se todos aqueles que pensam que tomba aquele cujo voo afinal vira sempre asa!

O rio diz que estamos rolando

Houve alguém que, finalmente, publicitou uma mensagem. De quem a voz? Quem a silencia? Quem a detém e espia? Alguns minutos. Algumas páginas de jornais. Sem grandes alaridos. E assim perpassa a angústia dos tempos atuais. Um desconcerto. Não do mundo, mas de quem perceciona a vida de forma caótica. Traumas, vazios… enfim. É um olhar os prédios que nos rodeiam e ver apenas paredes e janelas fechadas e não o sol de gente decente que as habita. O sol existe, mas a natureza humana insiste em cerrar cortinas para não deixar entrar a luz. O que vale é que há sempre alguém que, de forma quase louca, aos olhos dos reinantes, teima em tocar a campainha destes prédios silenciados. E um toque de campainha no silêncio desta rua instaura de imediato um caos, uma insurreição. Só que, por vezes, por mais corajoso que seja o gesto de avançar, torna-se impotente face ao ouvido impávido de quem insiste em não ouvir, até porque é vencido o cavalo pelo cansaço. Mas tudo corre, a natureza continua o seu cu