Iam todos juntos para o tal retrato. Era assim a única pose do ano. Ele, guardião hirto e sério. Ela, ordeiramente cheia de crianças à volta, umas sentadas no seu colo, outras de pé, os mais velhos e rapazes já com direito à verticalidade. Ela, ar grave de quem se habituara a falar baixo e a pedir pouco. Tudo a preto e branco. A roupa tão preta, as faces e mãos tão brancas naquele cenário tão sombrio onde ninguém sorria, ninguém dava ares da sua graça. Era chapa batida. Todos iguais e para a posteridade. Todos iguais, apagados de brilho e de vida. Nunca se chegava a entender se era um retrato belo ou útil. E, depois de todo o ensaio fotográfico, seria o centro de uma qualquer sala de jantar, mesmo por cima da cristaleira. Entre os ricos, o retrato abrilhantaria uma sala maior, entre os pobres não passaria de um pequeno retrato num cubículo abençoado pela sagrada família.
Agora, quando nos detemos em tal retrato e decidimos retirar-lhe o vidro já baço e desencaixilhá-lo da apodrecida moldura, é como se aquelas pessoas de repente nos quisessem gritar e contar-nos todos os constrangimentos daqueles tempos. É o retrato útil pela necessidade de nos lembrarmos daqueles corpos enrijecidos e mansos, daqueles rostos apagados, daqueles olhares subservientes e das bocas preferencialmente pequenas e caladas.
( imagem de autor desconhecido retirada de https://obeabadosertao.com.br/)
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