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irónico

O senhor Joga Seguro sempre teve medo de voar. Fez a mala. Beijou os filhos, em jeito de despedida. E esperou. Uma vida inteira. 

E nunca chegou a partir.  O avião caiu. 

Aliviado, disse: «Ainda bem!»

Irónico, não?

Soube a chuva em dia de casamento, a dádiva pré-paga ou a bom conselho recusado. É que este senhor joga sempre pelo seguro e, portanto, já estava à espera. E esperou uma vida inteira.

A vida tem a sua piada, um certo jeito sub-reptício, algo cobarde, de te ajudar quando tudo corre bem e de te afundar ainda mais quando tudo corre mal.

Irónico, não?

A vida tem a sua piada. Sabe, por vezes, a engarrafamento quando já estás atrasado. Parece que soa a placa do «É proibido fazer!» quando te preparas para o fazer. Sabe à sorte de teres dez mil colheres quando precisas apenas de uma faca. Sabe à angústia de encontrares, finalmente, o teu príncipe encantado com a sua encantadora companheira.

Irónico, não?

O senhor Joga Seguro sempre teve medo de voar. E nunca chegou a partir. Por uma questão de precaução. 

Mas, agora, que tem 98 anos, é um homem idoso. 

Ganhou a lotaria. 

Morreu no dia seguinte.

Irónico, não?

Soube a Mosca-negra em uva Chardonnay. Soube a dois minutos de atraso. 


(reinterpretação de «Ironic», Alanis Morissette)








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