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um pomar feito de ti, quem diria

 tu também não me sais dos dedos agarras-te à laranja e formas um pomar um pomar feito de ti, quem diria pensava que só servias para me lembrares da pequenez das minhas palavras um pomar, Tu. deleitemo-nos então em volta dos vários pomares de Tus que por aí existem (excerto de um poema de Cláudia R. Sampaio)

uma espécie de oração

a simplicidade de ficarmos com o instante das madrugadas o espanto de nos encantarmos com a música e seus malmequeres a paz de nos plantarmos de pés na terra e deixarmo-nos semente  e que por nós adentro rebente em flor a procura de saborearmos a beleza da certeza da derrota que nos instiga continuamente a recomeçar porque ainda há mais saída que cansaço

ninguém é sem cadastro

Na rua nada tem medida a não ser a que lhe quiseres dar.  E essa é a felicidade.  E há coisas que só têm a importância que lhe quiseres atribuir.  E essa é a liberdade.  Seja de dia ou de noite, ao princípio da manhã ou ao fim da tarde, é só saber esperar a luz certa que te acerte o olhar.  E essa é a felicidade.  Não as coisas interessantes por si só,  mas o interesse que nelas vês e que te torna livre de pensar nelas da maneira que quiseres e sem direito a manual de instruções.  É essa a liberdade.

não se apaguem as velas

preciso de um barco a roçar-me os olhos todas as manhãs para que não se apaguem as velas (Ângela Marques)

um e outro inseparáveis

O bem e o mal, pouco dele sabiam, porém tudo: quando o mal triunfa, o bem oculta-se; quando o bem se manifesta, o mal fica à espreita. Um e outro invencíveis, inseparáveis de uma vez para sempre. E por isso, na alegria – a angústia misturada, no desespero – sempre uma esperança calada. (Wislawa Szymborska)

grãos de areia

Há dias assim –  assim aéreos em que sei lá… se deve respirar livremente só porque sim, livre de indícios e de marcas  correndo a sorte de nos encontrarmos de contentes

o suficiente

Eu e a minha forma de viver complementamo-nos o suficiente para parecermos vistas de longe um todo (Ekaterina Yossifova)

vão-se os dedos e ficam os anéis

Hoje, durante a minha caminhada, dei de caras com esta casa.  Impôs-se-me ao ponto de me obrigar a suster a passada. Talvez tenha sido, a seu tempo, uma das casas mais bem compostas do sítio. Uma casa em pedra, rés-do-chão, primeiro andar. Bem localizada, muito perto do centro da cidade. Bom terreno e outrora cheia de gente nela que a enchia de esperanças. Se tivesse ficado apenas por uma olhadela superficial, teria concluído tratar-se de uma banal casa em ruínas. Só fachada. Nada de especial.  No entanto, desacelerei para observar. Topei uma ainda janela entreaberta, meia portada verde sulfato que permitiu enxergar o interior. Afinal, não era só fachada. Aquela casa era principalmente interior. Não a preto e branco, mas a cores primárias e secundárias em perfeita comunhão. Um quadro magnífico de estragos que o tempo impõe. Um interior húmido, sombrio e rico em destroços. A gente daquela casa desertara, morrera. Tudo o que ficou foi sendo alvo da ação implacável do tempo....

essa gente era uma espécie de solução

a partir do momento em que se predispõem a abrir cova para colocar semente uma a uma pacientemente devem esperar que cresça a vontade de ver nascer e principalmente que se alimentem para que renasça  a vontade de tornarem a semear (o título é de Konstantinos Kaváfis)