Avançar para o conteúdo principal

Mensagens

A mostrar mensagens de maio, 2025

e nem por isso deu descanso

o domingo é, em última instância, uma desgraça principalmente depois das seis da tarde porque há um silêncio por todo o lado e nem por isso deu descanso parece que soa a nada ou a tudo o que não se quis ou que não se aproveitou ou que não se fez o domingo é, por excelência, uma indefinição tem o peso do dever à espreita, mas chamam-lhe dia de folga parece o fim de uma primeira temporada e pode muito bem ser só isto

ouve como range

ouve como range a porta           que não se fecha exibe o trinco aldrabado           que ninguém mais ousa almeja ser reserva de chegada     e murmura assim entre dentes        como quem quer e não quer o que é ser dentro ou ser fora                já nem sabe

E eu sei disto. Sei muito bem do que falo.

Quero falar-te no abraço de mãe.  Dura muito. Uma vida inteira. E vai-se moldando  em função do tamanho de um filho.  E o filho cresce e cresce e a mãe vai esticando os braços. Muito, muito.  Exageradamente abertos, sempre prontos a acolher.  O abraço de mãe não esgota, não se esgota. E eu sei disto. Sei muito bem do que falo.

primeiro, respira, depois, repara

Primeiro, respira. Nem que seja com a parte do pulmão que ainda acredita. Depois, repara: - o mundo não acaba. Nunca acaba. E a vida, essa sem-vergonha que se reinventa ensina-te que amarás de novo. Talvez de forma mais tímida Ou com o exagero dos que já perderam tudo. (Andrea Fernandes)

Não concluas que é sempre fria a água do balde.

Não suponhas que as formas nascem do olhar. Não questiones a razão da tua cor. Não te impressiones com muros iluminados. Não te esqueças que não há gritos com respostas. Não queiras quem caminhe ao teu lado indiferente. E nunca tentes emendar o que não tem conserto. Nunca leias um livro único uma única vez. Não tentes aprender equações repetindo. Nunca te arrependas do relâmpago duns lábios procurando outros lábios. E nunca pretendas decifrar mistérios. Não batas a nenhuma porta para matar a tua sede. Nem mates os anjos com beijos revoltados. Não duvides da inevitável solidão do tempo. Não leves tão a sério o desejo. E nunca esperes por uma palavra – di-la! Não concluas que é sempre fria a água do balde.

Guardo a rua que se afasta

Guardo a rua que se afasta e as pétalas que se agigantam quando semicerro o olhar Daqui deste alpendre, arranco pensamentos desta cadeira onde me baloiço na quase-noite  Há lírios matizados no peitoril da janela quebrada e azulejos perfeitamente desenhados A luz tremelica dentro do cubículo vejo-a cá de fora.  Guardo o grito que fere o entardecer  o rouco ladrar que estala ao longe  o último pio dum pássaro  que atenta em zig-zag o gato esquivo  Guardo a aranha que teia  o escaravelho que salta a escada  e a escada que conduz à poeira  que a chuva já amainou.  Guardo a púrpura tarde!  Há cheiro a buganvílias e jacintos uma tarde vaporizada… O chão está quente – dizem-no os meus pés descalços O vento suave – dizem-no os meus cabelos parados Daqui deste alpendre guardo o meu olhar que se estende para lá, muito para lá da tarde Respiro e guardo A paz que desce da espinha aos pés.